segunda-feira, dezembro 23, 2024

A questão do macho beta e uma famosa foto

Não sei você, mas eu costumo ser bombardeado com propagandas de cursos e palestras envolvendo relacionamentos, lifestyle e coisas do tipo. Recentemente venho recebendo uma série de propagandas de livros e produtos digitais no que se convencionou chamar de cultura “redpill“.

A verdade é que eu me sinto velho para essas coisas de redpill. Numa boa. Tenho preguiça.
Volta e meia, vejo entrevistas de podcasts com uns carinhas que se acham os reis da cocada preta, o que é, ao meu ver, um auto-engano ilusório-hipócrita edificado sobre a menos valia.

Há décadas que o homem vem enfrentando uma crise profunda de identidade, e nos tempos que eu ainda tinha algum saco para essa discussão do professor Sócrates Nolasco, (leia-se no tempo que eu estava na faculdade de Psicologia) já se discutia a construção da imagem do homem, que foi do Tarzã ao Flash Gordon e terminou no Homer Simpson.  Não estou aqui para dizer se redpill funciona ou se é o novo delírio dessa moçadinha bonita que gosta de tomar Campari, para o qual toda mulher é um mistério perigoso, um tesouro oculto e insondável, a porta atrativa dos prazeres carnais, e ao mesmo tempo, a inconstante, insondável incógnita, repleta de vicissitudes e perfídias.

Mas nesse post, vamos falar da icônica foto, que ilustra um clássico do testemunho redpill, que (pelo menos em alguns emails de atrair bobo para curso) dividem homens em categorias e chancelas, como Macho beta, sigma, alfa e até ômega. Nada como usar letras gregas para dar um cunho mais clássico a um conjunto de achismos tirados do meio do olho do cu, sabe-se lá de onde, mas revestidos de um caráter acadêmico, né? Não esperaria nada menos que isso de vendedores de cursos e coachs de masculinidade, algo que de cara já soa tão patético quanto engraçado.

Tá na cara que só pessoas extremamente frágeis emocionalmente e com dificuldades serias de construção de sua autoimagem e na elaboração do próprio estar no mundo, podem se agarrar a uma visão estereotipada, generalizante e simplicista de mundo. Mas foi o que rolou.

Um “macho alfa” é frequentemente retratado como um indivíduo dominante, confiante e líder. Esse termo é originado do comportamento observado em grupos de animais, onde o macho alfa é o líder do grupo, o mais forte e mais dominante. Na cultura popular, o conceito de “macho alfa” ficou associado a características como assertividade, competitividade e sucesso com as mulheres. A ideia é que o macho alfa é o “homem dos homens”, o líder do grupo masculino. Não tardou pessoas que atuam no imaginário coletivo como meio de vida (já falei deles nesse post aqui) assumirem essa persona.

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Dan Bilzerian: Fortão, barbão espartano, e sempre cercado de jovens mçoilas repletas garbo e elegância – na mesma proporção em que as roupas delas se reduzem, ele enche a conta bancária. Tem quem compre isso aí.

Por outro lado, o termo “macho beta” é usado para descrever um homem que é menos dominante ou mais submisso em comparação com um macho alfa. O “macho beta” é frequentemente retratado como menos assertivo e menos bem-sucedido em termos de atração sexual e status social. Esse termo foi cunhado como uma espécie de contraponto ao macho alfa, sugerindo que nem todos os homens se encaixam no estereótipo de liderança dominante. Tudo isso, revela uma maneira binária de ver o mundo.

A ideia da visão de todos os indivíduos separados em machos alfa e beta caracteriza o beta como um homem rejeitado, com poucos atrativos para as fêmeas, enquanto o macho alfa é confiante e desejado pelas mulheres. Claro que de acordo com essa hipótese, no mundo natural, as fêmeas selvagens elegem o macho para a reprodução considerando características que garantem maiores chances de sobrevivência da sua prole. Nesse sentido, no reino animal fatores como força e tamanho são preponderantes para definir machos Alfas e Betas. Sendo que o Alfa gozará de várias regalias como exclusividade das fêmeas e até melhor disponibilidade de comida. Sendo assim, ao trazer essa ideia para o mundo dos relacionamentos do homo sapiens, a ideia de um beta se estratifica em homens inseguros, reativos, introvertidos, com baixa autoestima, tímidos, desinteressantes, pegajosos e por que não dizer, desesperados.

Em outras palavras, estão em uma escala inferior no que se refere a disputa de mulheres (fêmeas). Como resultado, precisam de grande esforço para conseguirem sexo e companhia.

Aí chegou o Sigma na parada.

A nova modinha masculina do TikTok, aquela rede social onde além de requebrar o bumbunzinho para os outros verem, tem essas palhaçadas de criar categorias. Eles tem aparecido cada vez mais nas redes sociais. São publicações, vídeos e memes sobre ser um “homem sigma”. No TikTok, por exemplo, buscas pelo termo já resultam em 2 milhões de vídeos publicados. Mas o que exatamente quer dizer isso?

O termo é descendente da divisão entre homens com personalidades “alfa” e “beta” que existe em círculos online há anos. Uma palhaçada tirada do cu de alguém que foi baseado em um estudo sobre a divisão social de uma alcateia de lobos, onde o líder seria o alfa, que tem direitos reprodutivos sob as fêmeas e direito aos melhores pedaços da presa; e os demais os “betas”, que se resignam a atuar um papel secundário, como eu já disse. Apesar de ter sido desmentido pelo próprio autor do estudo, que disse ter se enganado quanto às suas divisões sociais e que elas são muito mais fluídas do que ele havia pensado, as classificações atingiram o pensamento popular masculino (o que não surpreende, dada a qualidade da educação precária das pessoas bem como sua limitada visão de mundo) e têm sido utilizados desde então, seja em piadas, publicações inspiracionais ou em cursos de coaching, onde pululam técnicas de (tente não rir) destravar seu guerreiro viking interior.

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“Porque eu sou é homi, porque eu sou é homi, menina eu sou é homi…”

Eu acho isso uma coisa bem idiota. Mas aí veio o Sigma e o que diabos é isso? Precisei perguntar ao meu filho, o que oficialmente me chancelou como um velho, uma carta fora do baralho, uma bananeira que deu cacho, um verdadeiro Tio Sukita, e com certeza, um beta, é obvio – uma vez que tenho uma mulher só e estou com ela há mais de 25 anos.

Mas então, como eu ia dizendo, chegou esse tal de macho sigma. Uma nova classificação.

Apesar de ser criada com um caráter honesto, ela se popularizou primeiro como uma forma de ironizar o antigo binômio de alfa e beta. O sigma seria um homem que possui um sucesso social caracterizado a um “alfa”, mas tem uma personalidade mais introvertida, como um “beta”. Contudo, a difusão da terminologia fez com que ela fosse rapidamente incorporada por círculos que não percebessem seu tom humorístico – leia-se, os burros.

Segundo os desenvolvimentos da – olha o nome: teoria masculinista de personalidade, o sigma se encaixaria no perfil de um “lobo-solitário“. Independente por escolha própria, mas ainda sim um vitorioso no aspecto social, econômico e romântico.

Ah, como é bom ser fodão, né gente?

Se há alguns anos atrás as pessoas comentavam e almejavam se tornar um homem alfa, a moda hoje em dia é por se tornar um sigma, representados por personagens como Saul de Better Call Saul, Matt Murdock de Demolidor, Bronn de Game of Thrones e até o Constantine (espero que o dos quadrinhos).

Mas então nessas paginas desses pulhas que empurram essas conversas fiadas para idiotas de mente fraca com objetivo de dar curso, palestra, coach, mindiset modulation e até mesmo auto hipnose quântica, prometendo converter um looser num cara descolado e atraente, um verdadeiro outlier. Nesse material, eles às vezes usam uma foto clássica para ilustrar o alfa o beta e as mulheres em geral. A ver essa foto, se estivesse vivo, Pierre Weil o autor de “o corpo fala”, chegaria ao clímax.

Vamos à ela:

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Quando você é o Mick Jagger mas o outro cara é o Alain Delon

Hahaha. Porra, Mick.

Há claro, uma visão machista de mundo na apreciação dessa foto. Mas é inegável que ela é construída com uma comunicação não verbal primorosa, onde podemos ver num lado o jovem Mick Jagger, humilde, macambúzio, encolhido, com meias de cores diferentes e uma presença contida, quase que pedindo desculpas por estar vivo. Mick está sendo oprimido pela masculinidade e carisma sexy do Delon. E pior: A garota no centro é a namorada do Mick e parece estar se derretendo em sorrisos para um animado Alain Delon, – que era – e  para muitas pessoas, ainda é o homem mais bonito que vagou pela face da Terra (ou pelo menos da Champs Élysées).

O fato inconteste é que Delon tem uma postura confiante (também com esse naipe é fácil) e cruza a perna de um modo másculo e expansivo em absoluto contraste com Jagger, até em sua vestimenta, que é realmente patética.

A ponta dos pés dela,  como nos ensina Pierre Weil já dá a entender o interesse da moça. Mas vamos aprofundar de onde saiu essa foto.  Curioso sobre ela, fui fazer o que eu sempre faço, pesquisar.

A foto foi tirada em Paris em 1967. No centro da composição está a então namorada de Mick Jagger, a cantora Marianne Faithfull. Apesar de seu sobrenome, que significa “fiel”, esse sobrenome soava quase que como uma piada de mau gosto do destino.

Basta dizer que ela deixou seu primeiro marido, logo depois que acabara de dar à luz um filho, para ficar com o Jagger.

No entanto, eles não estavam apenas familiarizados com Mick. Na verdade, foram os Rolling Stones que descobriram o talento de Marianne. Eles também escreveram o primeiro álbum para ela. No futuro, Marianne Faithful também se destacou em várias composições dos rolling stones conhecidas, e não apenas como musa, mas também como coautora.

Em 1967, Mick e Marianne formavam um dos casais mais famosos  da cena musical londrina (a cidade passava por uma revolução musical e da moda). Foi Marianne quem foi encontrada no apartamento de Jagger durante a famosa operação antidrogas, vestida … com um tapete de pele. Em geral, os caras queimaram suas vidas ao máximo. Sexo, drogas, rock and roll.

Na foto você está vendo um pequeno fragmento da viagem dos Rolling Stones a Paris durante a turnê europeia com o novo álbum Between the Buttons. Era o auge da fama deles, tudo girava em torno deles. Alain Delon, aliás, chegou a prestar homenagem. E qual foi o fim do assunto?

Aqui está como Marianne se lembra desta foto:

Sim, a foto é estranha. Dois símbolos sexuais absolutos tão diferentes e eu, no meio, curtindo a situação! Lembro que Mick naquele momento estava realmente com muito ciúme e agia como uma espécie de meu dono. Isso era incomum para ele. Ele nunca teve um motivo, a maioria dos nossos amigos eram gays, menos o Keith, então… E de qualquer forma, eu não gostava do Delon, não era meu tipo de cara, então eu dizia não se preocupe.

Em geral, nada aconteceu, nos dispersamos. No entanto, o sedimento permaneceu! Mick torceu as pernas intencionalmente e parece uma espécie de coruja. Talvez ele já sentisse que seu relacionamento com Marianne estava na prorrogação e terminaria com ela o deixando!

Viciada em drogas, excêntrica, no auge de seus problemas de vício, ela abandonou Mick Jagger.

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Marianne com Lorde Rossmore

 

É verdade que havia um motivo: ela teve um caso com um impecável aristocrata inglês, Lord Rossmore. Trama clássica: um nobre senhor salva uma garota perdida na rua. E o final clássico: nenhuma história de salvação.

Um ano depois, Marianne se viu no Soho, numa espécie de ocupação, sem dinheiro, amigos, carreira e enfiada até o pescoço no vício. Foi então que ela adoeceu com laringite e perdeu para sempre a voz sonora, que ficou com som de taquara rachada e rouca.

Não se preocupe, tudo acabou bem no final. Marianne saiu e começou uma nova carreira musical, Jagger a esqueceu com segurança com novas garotas deslumbrantes.

Alain Delon nessa época estava (desconfio que não) fora do mercado. Se não me engano com datas, ele tinha se separado da linda esposa Romy Schneider com quem a chifrava com a outra linda e super gente fina, e amiga dela – Mireille Darc  com quem ele depois ele amigou.

Era o auge da carreira em 1967, e dizem que não rolou nenhum affair com Marianne Faithful.

A Mireille Darc é essa aqui em baixo:

De volta a tal foto, eu sempre me lembro de uma discussão no twitter há muito tempo sobre ela se essa Marianne deu ou não deu para o Delon. Lá pelas, tantas, uma mulher disse:

“Não sei se deu ou não deu. Mas se não deu, devia ter dado.”

Desculpa, Mick.

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Philipe Kling David, autor de mais de 30 livros, é editor do Mundo Gump, um blog que explora o extraordinário e o curioso. Formado em Psicologia, ele combina escrita criativa, pesquisa rigorosa e uma curiosidade insaciável para oferecer histórias fascinantes. Especialista na interseção entre ciência, cultura e o desconhecido, Philipe é palestrante em blogs, WordPress e tecnologia, além de colaborador de revistas como UFO, Ovni Pesquisa e Digital Designer. Seu compromisso com a qualidade torna o Mundo Gump uma referência em conteúdo autêntico e intrigante.

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Comentários

  1. Os caras que tiram dessa foto a conclusão de que Jagger seria um beta, estão se contradizendo, pois, quem seria mais alfa do que um rockstar no final dos anos 60? E outra, acredito que essa postura do Mick ali no sofá devia ser, simplesmente – e muito provavelmente -, por ele estar brisando!rs

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