domingo, dezembro 22, 2024

O cubo da felicidade

José Olympio estava voltando do trabalho para casa. Havia sido um dia árduo de trabalho.

Zé, como eu prefiro chamá-lo, era um homem humilde e caminhava na beira da estrada, empurrando sua bicicleta com um botijão de gás em cima. Ele fazia aquele caminho todos os dias, pelo menos duas vezes. Isso quando não ia para casa almoçar, porque nesses dias, eram três viagens.

Ele caminhava em seu passo lento, quase arrastado. Sua mente, mais vazia que a de um monge. Ele ouvia os passarinhos cantando no mato e via a terra seca esquentando seus pés sujos da graxa da oficina e não pensava em nada.

Mas aquele não era um dia comum. Se fosse, eu não perderia meu tempo descrevendo os acontecimentos deste dia aqui. Zé, andava em seu passo de urubu cansado de volta para casa sem imaginar que em menos de dois minutos tudo mudaria ao seu redor.

Zé deu uns poucos passos quando a coisa atingiu-lhe a cabeça. Doeu. Zé ficou tonto. Achou que ia desmaiar. Levou a mão até o crânio e assustado viu que ela estava empapada de sangue. Pensou ter sido alvo de uma pedrada. Olhou em volta e não havia nada além da estrada vazia, o mato e alguns galhos caídos na beira da estrada. Ou seriam raízes, sei lá.

Zé abaixou-se instintivamente e escondeu-se como pode sob a bicicleta. Ficou à espreita. Sua cabeça doía. Não havia riso, nem fala nem sequer respiração além da sua. Ele praguejou contra o vazio e a única reação que ocorreu com seus gritos foram uns passarinhos que voaram de uma moita próxima.

E fez-se um silêncio. Zé passou a mão no short e tornou a passar na cabeça. Tinha menos sangue. Ele ficou mais calmo.

Foi quando notou que uma caixa de ferro estava ali, parada aos seus pés. Parecia ter o tamanho mais ou menos de uma pedra portuguesa. Mas era de ferro, ou algo assim. Ele pegou a caixinha e viu que era de metal, mas não era pesada como se fosse de ferro, nem fria, nem quente, nem leve. Era um peso médio.

A caixinha não tinha solda, prego, parafuso ou mesmo oxidação. Era brilhante e clara. Graças a isso, Zé podia ver sua cara de espanto. De onde ela surgiu ele não sabia. Olhou para cima e viu o céu azul sem nuvens.

Ao virar a caixinha, ele notou um pequeno texto gravado nela. Forçou a vista para ler. Zé não era “lá essas coisas” nas artes da leitura e da escrita, mas sabia ler com alguma dificuldade.

“Cubo da felicidade. Aperte o botão e alguém morrerá” – Era o que ele conseguiu ler. Eram letrinhas miúdas e abaixo havia apenas um círculo bem definido…

cubo da felicidade3 | Contos | conto

-Deve ser o tal botão. – Pensou Zé Olympio. Mas ele estava intrigado. Primeiro, uma caixa de metal estranho cai do céu e nela está escrito que alguém vai morrer. Mas a caixa se chama “caixa da felicidade”. Aquilo é um óbvio paradoxo, foi o que Zé pensou. Obviamente não nesses termos sofisticados, porque Zé era um homem simples. Mas era inteligente e pensou duas vezes se devia mesmo apertar aquele treco sem sentido que prometia matar alguém.

“Cubo da felicidade. Aperte o botão e alguém morrerá. Cubo da felicidade. Aperte o botão e alguém morrerá…”

Zé caminhava levando sua bicicleta com o botijão amarrado, mas agora ele tinha a cabeça ferida e cheia de novos e intrigantes pensamentos dentro, que se sucediam infinitamente.

Quando chegou em casa, chamou logo a Rosária para mostrar o estranho objeto. A mulher surgiu descabelada no parapeito da janela, porque sempre que Zé Olympio chamava “Téia” pelo nome, era coisa séria. A janela era de uma casa meio velha, que havia sido do seu pai e antes dele, do seu avô. O telhado era morada de centenas de passarinhos e as paredes tinham mais lagartixas do que rachaduras e pedaços de reboco faltando. Na porta, uns três bacuris barrigudinhos só de short e chinelos trocavam bolinhas de gude. Tão logo viram a figura entrando pelo portãozinho, correram para saldar o pai.

Em minutos fez-se uma pequena multidão em volta de Zé para ouvir como ele foi atingido por uma caixinha que caiu do céu. Não tardou a surgirem hipóteses variadas para o estranho fenômeno:

– Presente de Deus – Sugeriu a comadre Suely

-Não, isso é coisa do diabo. O diabo que manda essas coisas. – Contra-argumentou o velho Tonico da mercearia, sempre carola.

-Eu acho que isso é coisa de “disco avuadô” – Falou o Neca da olaria, que vinha passando e resolveu conferir o que uma multidão fazia ao redor de Zé Olympio. E completou ante o espanto de todos:

-Não tem disco voador aqui? Eu já vi. Marcolino viu e até o falecido seu Dijalma, também viu uma luz esquisita brilhar perto do ribeirão, no dia seguinte um boi apareceu mor…

-Besteira- Interrompeu Tonico da mercearia. – Disco voador, caixinha mágica, tudo isso é manifestação do diabo. Do inimigo. Do coisa ruim, gente. Tem que ter um jeito de saber se a caixa é de deus ou do dêmo.

Foi quando a Beata Narcisa, do alto de seus 98 anos falou. Incrível, eu sei. Mas o fato é que ela falou. Acredite se quiser!

Beata Narcisa nunca, nunca falou nada além de “amém” na missa em mais de 50 anos. Quando ela abriu sua boca já sem dentes e pronunciou algumas palavrinhas, causou uma enorme comoção. Era o primeiro milagre da caixa da felicidade.

Ela disse (bem, na verdade ela sussurrou uma coisa que não dava para entender, mas que fontes seguras – Dona Néia e seu Devanir do posto – dizem que o que ela falou foi, não necessáriamente com essas mesmas palavras: “Se for do rabudo, aposto que se benzer isso aí na água benta, a coisa vai ferver. E se for de Deus, ela vai iluminar.”

A fala da beata Narcisa foi amplificada pelo povo, que começou a confirmar aquele fato óbvio do conhecimento popular. Tudo que é do capeta ferve na água benta. Certo como dois mais dois são quatro. Logo, se ferver, é dele.

-Será? Indagou Zé Olympio confrontado com as possibilidades que aquela gente simples apresentava. Imediatamente alguém gritou:

-Vamos benzer! – E então seguiu-se uma série de gritos de “Benze!, Benze!, Benze!” a criançada correndo gritando, todos animados, querendo tirar a prova dos nove. Zé não teve outra opção senão concordar e levar consigo a caixinha, que não deixava ninguém além dele tocar.

Quando o Padre Afrânio surgiu na porta da igreja, todo suado depois de cochilar após o almoço, deparou-se com uma turba que tinha pelo menos seis vezes o tamanho da multidão que se formou na porta da casa do Zé minutos antes.

Após explicarem toda a situação, o Zé mostrar o pequeno corte em sua cabeça, o sangue no short, e o cubo, que não saía de suas mãos, o padre se preocupou.

-Como é? Caiu do céu?

-Sim senhor, seu padre. Do céu. Direto na minha cabeça, como eu contei.

-Verdade mesmo, Zé? – Indagou o padre com uma sobrancelha levantada mais que a outra.

-Sim, padre. Eu juro.

-Jurar é pecado.

-Ah, é mesmo. Desculpa padre. Perdão. Mas é verdade sim senhor.

-Então, se caiu do céu, a caixa é de Deus, ué. – Afirmou o padre de um jeito categórico. E emendou seu raciocínio: – …Afinal, se fosse do inimigo, do satanás, não viria do céu, pois o céu é morada de Deus, dos santos e dos anjos. Satanás mora nas profundezas, onde os pecadores e pagãos sofrem com o pavor e a maldição dos dentes e garras do belzebú. Lúcifer. Mefistófeles!

Nisso, a multidão só aumentava e já surgiam pessoas de todos os cantos para ver a “caixa de Deus”.

E então o Tonico pediu pra falar. O padre concordou, e Tonico:

-Mas padre, sendo o senhor representante da Santa Igreja, logo, de Deus aqui em Conceição de Sobral, se a caixa fosse um presente de Deus, não devia ser para o senhor?

-… – O padre ficou sem ação. Aquilo realmente fazia um certo sentido, já que se fosse coisa de Deus, deveria cair na igreja e não no velho Zé Olympio cachaceiro da oficina. Um pecador pobre. Afinal, o critério de Deus só podia ser de merecimento. Vendo que a multidão estava em profundo silêncio a espera de um veredicto, o padre sentindo que se demorasse mais alguns segundos sua fé e natureza divina seria questionada na porta da paróquia sugeriu:

-Sim, mas vejam só vocês. Onde vocês estão?

-Na porta da igreja, ué. – Disse Olympio meio sem entender.

-Então, não seria uma vontade de Deus todo poderoso me mandar a caixa, sendo você seu Zé, apenas o mensageiro? O entregador? Veja, vocês trouxeram a caixa pra mim. Fizeram o que Deus, o Altíssimo, quer. E que assim seja.

– E o povo em uníssono: – Amém!

Zé Olympio deu um passo atrás e afastou a caixa das mãos do padre que já iam na direção dela.

-Ah, padre. Não sei não. Agora tô desconfiado que pode ser coisa do diabo mesmo. Veja o senhor, todo tranqüilo na sua paróquia. Então venho eu com a multidão trazendo a caixa. Vamos dizer que o senhor aperta o botão e o senhor mesmo morre. A caixa chama caixa da felicidade. Quem fica feliz quando o padre morre? – Perguntou Zé para o povo na escadaria.

-O dêmo! -Gritou alguém no meio do povo. Muitos apenas balançaram a cabeça afirmativamente.

-Neste caso, só há mesmo uma maneira de saber. -Interpelou Tonico da mercearia. Vamos jogar a água benta. Se brilhar, é de Deus. Se fumegar, é do cão!

-Benze, benze, benze… Tornou a gritar o povão.

O padre fez um sinal para o povo. A multidão silenciou e ele prometeu pegar a água benta. O povo aplaudiu. Padre Afrânio voltou-se para dentro da igreja empolgado e fechou a porta.

As pessoas ficaram ali, naquele sol inclemente, esperando uma solução. O padre demorou e em pouco tempo, surgiu uma caminhonete lá em baixo, buzinando para as crianças, que agora eram centenas, saírem da rua.

Da caminhonete desceu o Dr. Reginaldo Carvalho de Moraes Cury, o homem mais rico da cidade. Dono de metade do que dava pra ver. E a outra metade, que não dava pra ver, também era dele.

A multidão abriu para que ele e seu secretário passassem. Eles voram direto até Zé.

-Fiquei sabendo que o senhor achou uma caixa… – Disse Dr. Reginaldo.

Zé acenou com a cabeça. Olhar baixo em sinal de respeito.

-Quer vender?

-Pra que? -Perguntou Zé Olympio.

-Não interessa. Quer vender ou não quer?

-Não sei. O padre foi buscar água benta. Vamos ver se é do diabo ou de Deus.

-Ah, mas então, seu Zé. Olha aqui. Eu dou um lance nela. Te vendo aquele terreno da sua casa mais toda a terra que vai da olaria até o bambusal lá perto do sitio do Ninoca.

-Nossa! – A multidão estava espantada. Reginaldo estava oferecendo mundos e fundos pela estranha caixa. Todos voltaram-se para Zé. O pobre Zé que agora estava com o maior dos dilemas na mão. Ele olhou para Téia e ela tinha o olhar de quem gostaria muito de ser dona de seu terreno. Eles viviam desde a juventude na posse do bisavô de Zé, que veio passando de filho para filho. A casa estava velha. Tinha goteiras e parecia que ia cair a qualquer momento. O terreno daria a chance a eles de plantarem, de fazer uma lavra em parceria com o vizinho e melhorarem a casa.

Zé pensava. A multidão acompanhando a cena. Nisso surgiu o padre.

Tão logo surgiu, agora de batina, teve a mão beijada pelo Dr. Reginaldo.

-Bença padre.

-Deus te abençôe! – repetiu mecanicamente. O padre só tinha olhos para a caixa. Na verdade, sua demora estava explicada pelo fato de que antes de pegar a água benta, havia preparado o altar para colocar a caixa, o presente de Deus para ele em lugar de destaque. Enquanto colocava a batina, pensou em como seria bom fazer uma festa, com banda, com churrasquinho e doces, procissão, flores e até lavagem dos degraus da igreja matriz em homenagem a ele e a caixa. Além de uma caiação na paróquia e talvez até mesmo a restauração do altar secundário que estava tomado de cupins fazia 30 anos.

O Padre Afrânio já ia pegar o aspersor de água benta quando Dr. Reginaldo se interpôs.

-Calma padre. O Zé está pensando se vai vender a caixa pra mim.

-Mas como? Como é que é? Indignou-se o padre. Vai vender sem nem saber se é de Deus, Zé?

-Ah, é, Padre. – Disse Dr. Reginaldo. – Tem que vender sem saber, porque se souber, o preço pode subir ou cair. E isso não é justo. Veja bem, seu Zé. Eu posso estar te oferecendo mundos e fundos e vai que a caixa é do diabo? Óbvio que eu não vou querer te vender toda aquela terra se eu souber que a caixa é do cão e não vale nada.

-Ah, mas se a caixa for de Deus, aí ela vai valer muito mais que aquela terra, né? – Argumentou Téia.

-Sim senhora. Mas isso é um risco que seu marido tem que correr, né dona Rosária?

Zé Olympio apenas olhava para a caixa. Para as minúsculas letrinhas gravadas em baixo relevo, e o botão redondo, bem abaixo.

– Mas Dr. Reginaldo, para que um homem poderoso como o senhor deseja tanto esta caixa? -Indagou o padre Afrânio.

-Simples, seu padre. Eu amo minha vida. Meus filhos. Minha esposa.

-E daí Dr. Reginaldo? Não entendi. – Disse o padre.

-E daí que eu vou comprar pelo que está escrito na caixa. Olha aí: ” Caixa da felicidade. Aperte o botão e alguém vai morrer”. Viu?

– E…? – Perguntou o padre já começando a entender.

-E vai que esse “alguém” sou eu. Ou minha mulher? Ou um dos meus filhos? Se ele vender essa caixa pra mim, vou guardá-la numa outra caixa de aço lacrada e vou trancar tudo no cofre de meu pai lá na Fazenda Grande. E se a caixa matar alguém que eu amo? O senhor devia pensar nisso, padre. Imagina se a caixa matar alguém aqui? – Disse ele no tom político de costume, apontando para o povo humilde e assustado.

Pode ser qualquer um. Qualquer um!

E então alguém gritou: – Vende Zé!

E o povo repetiu: – Vende, vende, vende!

Mas o padre levantou os braços e conteve os gritos.

-Mas Dr. Reginaldo, eu louvo suas boas intenções, mas a julgar que a caixa é “da felicidade”, a pessoa que vai morrer deve ser alguém que te faça feliz. Sendo assim, conhecendo o senhor, posso imaginar que é seu adversário político seu Argemiro Gomes de Coimbra.

-Hã?

-Dr Reginaldo… Posso estar enganado, mas algo me diz que o senhor quer a caixa para apertar o botão e acabar com seu Argemiro.

-Reginaldo ficou sem jeito. Começou a gaguejar. Ficou vermelho.

Nisso, vem surgindo um carro branco lá na rua. Ele para ao lado da caminhonete. Do carro desce um motorista que abre a porta de trás do carrão. Dele desce um gordão. Novamente a população abre para ele passar. Ele está de terno branco. Tem um ar ameaçador e autoritário.

-Cadê a caixa? Deixa eu ver? Deixa eu ver! Sai!

Dr. Reginaldo olha para o padre e comenta: Viu? Falou no diabo…

-Olha o pecado, seu Reginaldo!

-Ops desculpe padre – disse ele se benzendo.

O gordão vem até o Zé.

-Então, seu Zé… – Diz ele amigável. Excessivamente amigável. -Esta é a tal caixa misteriosa que o povo fala.

-Pois é sim senhor.

-Deixa eu ver aqui, Zé.

-N-não, não senhor. – Diz Zé tirando a caixa da vista de Dr. Argemiro.

-Não adianta Seu Argemiro. O Zé não deixa ninguém pegar na caixa. – Diz o padre.

Argemiro rosna. Olha para o padre. Olha para o Dr. Reginaldo. Dez anos mais novo que ele. Ambos se entreolham com raiva. O clima fica tenso.

– Não vem que não tem, seu Argemiro. O Zé vai me vender a caixa.

-Isso é o que nós vamos ver. Zé, quanto você quer na caixa? Quanto este puto…

-Olhaí o palavreado na porta da casa do Senhor! – Berra o padre. Os óculos pulam na ponta do nariz do velho Afrânio.

-Desculpa, padre. Quanto este senhor ofereceu pra você pela caixa, Zé?

-B-bem… E- e-ele me of-ofereceu o terreno lá da minha casinha, mais a terra que vai da olaria ao sitio do Ninoca.

-Pois eu dobro o terreno na minha propriedade e ainda dou uma casa novinha com televisão, geladeira e até ventilador! E ainda dou um fusca!

A multidão se espantou.

A mulher de Zé olhou pra ele com olhar comprido.

-Mas eu cheguei primeiro. Eu fiz a primeira oferta. Eu tenho preferência, né Zé? – Perguntou em tom intimidatório Dr. Reginaldo, mexendo na lateral do paletó para mostrar uma coronha de revólver na cintura. Zé Olympio, com medo, recuou.

-Tem preferência é o escambau! Eu sei pra que você quer a caixa. Quer apertar pra se ver longe de mim, né desgraçado? – Berrou a plenos pulmões sacando um revolvão.

-Senhores, senhores… – O padre tenta conter os Ânimos. A coisa esquenta. O povo começa a rir e aplaudir. Uns três ou quatro correm. Mas a maioria fica. Querem ver sangue. Alguns jovens lá na rua começam a incitar a confusão, cantando a musiquinha da campanha de Argemiro para vereador em 1988.

– E você não, seu maldito?

Estava feita a confusão. A fusarca toma conta da porta da igreja. Os políticos resolvem lavar a roupa suja. Cada qual tem um revólver na mão. Um parte para cima do outro. Mulheres gritam. O barbeiro e o dono da venda tentam agarrar os dois para evitar a briga. O padre salta e se esguela. O povo se divide.

O padre sobe no beiral da escadaria e grita para o povo:

-Calem a boca! Silêncio! Guarda esse revólver Já! Respeita a casa de Deus! Você também! Não tem vergonha não? Vamos tratar de me respeitar que eu conheço vocês dois desde que foram meus coroinhas! O Zé vai decidir o que ele quer fazer. Que seja feita a vontade do Zé!

O povo se acalma. Há um silêncio mortal. Os políticos guardam as armas e evitam se olhar nos olhos. Todos olham para o Zé.

O povo esperando. O Dr. Reginaldo também. Dr Argemiro pega um lenço do bolso e enxuga a testa. O Padre com o aspersor na mão pingando na batina. E Zé olhava a caixa.

Faz se um silêncio que pareceu durar vários minutos. A cabeça de Zé rodava.

O silêncio foi quebrado aos poucos com as pessoas falando com ele. Sugerindo. Alguns até mandando:

-Não vende!

-Vende!

– Eu dobro.

-Eu triplico.

-Benze, benze, benze!! – Gritavam três beatas lá no fundo do povo.

-Dá pra mim! – Gritou um mendigo cego que olhava para o sol com o violão em punho.

-Pensa bem, Zé! É a chance da sua vida. Chance que nem o seu avô, nem seu pai, ninguém teve.

-Zé, meu amor! Pensa nas crianças!

-Já disse! Isso é coisa do dêmo. Vai amaldiçoar sua vida! Destrua a caixa, Zé!

-É disco voador. Todo mundo viu. Todo mundo sabe que existe! Vamos chamar os caras do jornal. O pessoal lá da capital. Você vai sair no jornal nacional, Zé! Não vende não! Você vai ser famoso!

-Dá pro padre! É coisa de Deus!

-Não dá não!

-Dá pra mim!

-Pensa nas crianças, Zé. Por favor!

-Pensa bem, seu Zé. O terreno e bom e dou ainda uma caminhonete 4X4!

– E então eu dou duas! Mais o terreno e a casa com ventilador e televisão. Pergunta pra dona Rosária se ela não quer uma televisão, hein dona Rosária? Não ia ser bom? Daquelas grandes… Para ver a novela. Fala com seu marido, dona. Diz pra ele.

-Zé… As crianças, Zé.

-Maldição!

-Vende! Vende!

-Benze!

-Enfia no c…

-Olha o respeito na porta da casa do Senhor!

Tudo rodava ao redor dele. Zé estava zonzo. Apertava a caixa na mão. Nunca antes na vida sentiu-se tão pressionado.

As pessoas falavam todas ao mesmo tempo ao redor dele. Zé Olympio sentia-se sufocado. Estava sem ar.

Olhou a caixa, fechou os olhos…

Alguém no meio do povo gritou:

-Meu Deus! Ele vai apertar!

-Não, Zé. Pensa na casa, Pensa nos seus filhos, homem!

-Não adianta. Ele vai… Apertar! É agora!

-Alguém vai morrer!

-Nããããããããão!

E então Zé apertou o botão. Todos gritaram.

….

Clic!

….

Nada.

Não houve raio, luz, explosão ou fogo. Nem bomba atômica. Nada. Todos se olhavam assustados.

Zé olhava fixo. Estático, seus olhos apontados para o meio do povo.

Nada. Todos em silêncio olhavam pra ele.

Subitamente, alguém soltou um berro horrível no meio da multidão. Abriu-se uma clareira. Havia uma mulher emborcada no chão.

O povo correu para acudir.

-Dona Carmem da farmácia morreu!

Começou uma enorme confusão. Pessoas corriam de um lado para outro. Alguém apontou o dedo para Zé e gritou:

-Assassino!

Zé colou o corpo na porta da Igreja. O povo correu escadaria acima. Surgiram pessoas com paus e pedras. Incrível como a multidão surge com foices, facões e machados nessas horas, né? Pedras comiam soltas na direção dele.

O povo subiu as escadas correndo. Gritos de “Lincha, lincha”!

O padre abriu a porta da igreja e jogou Zé para dentro.

A multidão furiosa começou a esmurrar a porta.

Zé estava pálido. Não acreditava no que havia ocorrido. Logo dona Carmem da farmácia. Uma moça tão boa. Tava noiva a 9 anos e tudo…

Pedras começaram a estilhaçar os vitrais da igreja. O povo gritava “Vamos queimar! Queima que ele sai!”

Enquanto o povo tentava entrar na igreja para pegar Zé, dona Rosária, sua mulher chorava desconsolada num degrau amparada pelos três meninos. O povo todo queria ver a cabeça de Zé Olympio. Na falta de um espetáculo, a morte do mecânico servia. Só ficaram umas quatro pessoas lá perto da rua, olhando Carmem dura, com medo de chegar perto e mexer no corpo.

-Vê se ela morreu mesmo. – Diz um senhor para um rapaz.

-Deus me livre. Esconjuro! Nem doido que eu mexo em corpo morto pelo sobrenatural. Vai que eu morro também!

-Eu também tô sem coragem… E a senhora? A senhora pode mexer?

-Deus me livre!

Nisso, o povo invadiu a porta dos fundos da igreja. Um barulhão enorme. A gritaria começou a ecoar no templo. Padre Afrânio fez sinal para Zé subir as escadas que davam acesso a área do coral. Zé subia as escadas quando dois caras surgiram com paus lá em baixo no altar principal.

-Parem! Esta é a casa de…

-Cala a boca padre! A gente quer o Zé. Ele matou dona Carmem!

-Não meus filhos, pelo Amor de Deus! – Disse padre Afrânio tentando entrar na frente, mas ele tomou um pescoção que caiu estatelado no banco de madeira da igreja.

Zé subia o mais rápido que podia os degraus pequenos, feitos para as criancinhas do coral subirem na missa e que também eram usados para a coroação da Nossa Senhora.

-Pega ele! Pega ele!

Os homens subiam atrás com os porretes na mão.

Zé estava encurralado. Era alto demais para pular. Não havia nada ali em cima que pudesse usar como arma ou defesa. Só haviam as janelas. Aliás, os cacos e pedras e mais pedras voavam lá pra dentro. Lá fora ele ouvia os gritos de lincha, lincha.

Olhou para baixo. O que ele viu foi o interior da igreja cheio de gente com ódio, armados de foice, facão, enxada e o escambau a quatro. Os gritos ecoavam no interior da igreja.

Foi quando num solavanco, lá fora, ante o olhar estupefato das beatas e de um velho, a dona Carmem da Farmácia acordou. E todos levaram um enorme susto. As beatas desataram um mar de gritos.

-Aleluia! Aleluia! – Ressussitou! Ressussitou!

-Hã? Onde que eu tô? – Perguntou ela zonza.

-Ela desmaiou! Foi desmaio! – Disse alguém.

-Vão matar o Zé. Vão matar o Zé. Corre lá. Gritou o velho para o rapaz.

Nisso, lá dentro Zé estava tomando porretada na cabeça. A primeira derrubou ele no chão. A segunda acertou-lhe o braço. Zé estava sobre os cacos de vidro. Tentando defender-se como podia das pancadas. Mais e mais pessoas faziam fila para subir na área do coral e acertar uma porradinha pelo menos no pobre Zé Olympio.

Foi quando um grito alto e agudo irrompeu no interior do tempo:

-Paaaaaaaaarem! Todos olharam assustados. Era Carmem da Farmácia em pessoa. Os braços abertos.

Correu todo mundo escadaria abaixo para ver. Ela estava inteira. Havia desmaiado.

Em poucos minutos Zé saía da igreja, todo ferido, amparado pelo padre.

Todos olharam para ele com desdém. Muitos foram embora praguejando por não ver nem a solução mística da caixa nem a briga dos políticos, muito menos o lichamento do Zé Olympio.

Todos partiam com uma sensação de fim de festa. De desânimo, de frustração. O padre contabilizando os prejuízos dos vitrais.

Os políticos haviam dado no pé tão logo Zé Olympio apertou o famigerado botão.

O povo começou a voltar para casa. Retomar os afazeres. Além do mais, a essa altura, a novela das seis já estava terminando.

Zé fitou o estranho objeto. A caixa revelou-se uma inutilidade besta. O padre fechou a porta da igreja para arrumar a confusão.
Todos foram embora e só restaram Zé Olympio, sua mulher Rosária e Nininho, Romualdo e Cleverson Carlos sentados nos degraus.

Zé estava com vergonha. Sentou-se distante da família. Baixou a cabeça e chorou. Zé chorou.

Foi quando sentiu uma mão macia a passar-lhe nas costas. Um abraço forte por trás e pelos lados. Quando deu por si, Zé estava amparado pelos seus. E então ele chorou mesmo. Dessa vez, com vontade.

De todos aqueles, os únicos que não saíram de perto dele naquele dia, foram os filhos e a esposa.

Ele que pensou que esteve com tudo nas mãos e achava que tinha perdido, descobriu que a caixa realmente funcionava.

FIM

Antes que alguém me pergunte, realmente alguém morreu naquele dia. Foram os políticos Dr. Reginaldo e Seu Argemiro, que se encontraram na estrada e sem a turma do deixa-disso para apartar, eles dispararam um contra o outro. E durante muitos anos o município de Conceição de Sobral ficou sem vereadores safados.

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Philipe Kling David, autor de mais de 30 livros, é editor do Mundo Gump, um blog que explora o extraordinário e o curioso. Formado em Psicologia, ele combina escrita criativa, pesquisa rigorosa e uma curiosidade insaciável para oferecer histórias fascinantes. Especialista na interseção entre ciência, cultura e o desconhecido, Philipe é palestrante em blogs, WordPress e tecnologia, além de colaborador de revistas como UFO, Ovni Pesquisa e Digital Designer. Seu compromisso com a qualidade torna o Mundo Gump uma referência em conteúdo autêntico e intrigante.

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Comentários

  1. o nome do personagem principal ai lembra mto o daquele cara q trabalhava na sirfe rs!
    Philipe, acho q a abstinencia de coca cola ta fazendo efeito rsrs
    abrçs

  2. [quote comment=”venho todos os dias aqui ler seus´posts esse é legal super legal, porem termina sem um fecho, falta algumas informaçoescomo; nacionalidade,”municipiolalidade” entre outras.Ficou com gostinho de quero masis.
    Me perdoe porq a primeira vez que comento e ainda reclamo,penssando bem é até ijusto porque ter seu site para ler todos os dias,que nos faz rir tanto,é um previlegio que poucos conhecem.
    Um abraço e parabens pelo seun sininstro sininstro sinistro lobisomem

  3. Obrigado galera. Sim, Fernando. Isso é uma referência a aquele peão mesmo.
    Emilio, eu parei de beber coca-cola.
    Gabriel, as informações que faltam, na verdade não faltam. A cidade lá não existe e pode ser qualquer uma. Isso é metafórico e propositalmente deslocado de um ponto geográfico específico, como convém a uma história de realismo fantástico.

  4. Eu dei uma corrigida em algumas coisinhas, tinha uns vacilos de nomes trocados (Valeu Loo) e erros de digitação. Escrevi correndo para sair pra jantar e acabei publicando antes de revisar. Quando cheguei ontem de noite estava muito cansado e só revisei hoje.

  5. Mew qdo li o começo lembrei (não sei por q…XD)do anime Death Note, mas gostei!

    Conseguiu colocar no texto tudo o que é necessário para que o leitor leia do começo ao fim… (olha eu ia escrever sobre-items ae, e ainda aprendi isso na facul, só que esqueci… tenho memória de peixinho XD)
    Mto loko, aliás o que vc fêz pra parar de tomar Coca-Cola?
    Sou viciada nesse xarope químico…

    ah lembrei (ainda sem mta certeza sobre o primeiro item):
    Apresentação
    Clímax
    Desfecho

    Fuizzzzz…

  6. [quote comment=""]Cara, muito bom!!! Como sempre, inusitado e surreal! Vamos fazer um curta, a gente chama o David Linch pra dirigir!!!

    Eu voltarei![/quote]

    Volte! E traga seus amigos!
    Aí, quando que vc vai aparecer pra tomarmos uma gelada?

  7. Cara, esta tua história, é muito parecida com uma que assisti no seriado Além da Imaginação, o da TV (Parcida até de mais :-). Nessa história um senhor aparecia na casa de um casal endividado com uma caixa, com um botao no meio. Ele explicou ao casal que se eles apertassem o botao, iriam ganhar 100 mil mas alguem que eles nao conheciam iria morrer. Depois de muito deliberar eles apertaram e nada aconteceu. Depois de um tempo o senhor voltou para buscar a caixa e agradecia por eles terem apertado o botao e dizendo que o dinheiro estaria na conta do casal no dia seguinte. Quando o senhor estava saindo o casal perguntou o que ele faria com a caixa e ele disse: vou entregar para alguem que voces nao conhecem.
    Pegou a jogada? Veja se a tua história nao é bem parecida com esta, com a caixa, com um botao, que se apertado iria matar alguem desconhecido e que daria um premio por isso.
    Abraços

  8. Sim, esta do seriado com um casal se não me engano é um remake da versão original (escrita pelo Rod Sterling) que curiosamente era o próprio cara que apresentava o programa na versão PB. Esta era originalmente a história de um único sujeito endividado que recebe uma visita de um cara com a caixa e uma estranha proposta.
    A versão do twilight zone está explorando até que ponto o ser humano pode ir e passar por cima de sua humanidade em busca do dinheiro.
    A minha versão está focada nas relações sociais que se rearranjam a partir da entrada de um elemento novo e desconhecido numa ambiente fechado e estável.

    Mas você está certo. Ambas as histórias se parecem mesmo. O lance do botão, da morte e da caixa. LEgal vc ter lembrado disso. Esse episódio era muito, muito bom.
    Eu gostaria de escrever episodios do twilight zone.

    Lembra daquele episódio em que uma mulher recebe uma ligação de madrugada numa noite de tempestade e se apaixona pelo cara, que é educado e misterioso? Quando ela resolve descobrir quem é, vê que a tempestade destruiu o poste telefônico e o fio do telefone caiu dentro de uma sepultura. Esse foi ótimo… Se não me falha a memória o cara que fazia a voz lá era o Tulsa Doom do Conan o Barbaro.

  9. UM FINAL PARA A HISTÓRIA A PARTIR DO MOMENTO EM QUE ELE ACHOU A CAIXA:
    Ele leu o aviso: “Cubo da Felicidade. Aperte o botão e alguém morrerá”.
    Então pensou assim: “Já que o mandato do Bush está acabando, agora nem vale mais a pena apertar o botão”…
    Então jogou o cubo para trás, por cima do ombro.
    O cubo bateu exatamente com o botão numa pedra, e lá na Casa Branca um certo senhor, que foi a maior desgraça dos últimos 5 bilhões de anos para o mundo, teve um ataque cardíaco e morreu fulminado, com a língua de fora e a boca torta.
    ***Sinceramente, não desejo que ninguém morra, a não ser o Bush e um certo segurança de shopping que prefiro não comentar.
    —————–
    Mas mudando de assunto, o segredo que estava nos computadores que surrupiei da Petrobrás através de meus comparsas na firma americana, estavam com aqueles dados sobre a plataforma submarina, da reserva petrolífera Júpter.
    Agora não é mais segredo, porquê já revelei aqui no seu site logo que esvaziei os HDs.
    Tomei prejuízo com aquele negócio, porquê nenhum dos meus contatos internacionais quis pagar por aquelas informações de engenharia submarina e brocas de prospecção de petróleo.
    Então estou largando os computadores portáteis da Petrobrás por mil real cada um, e as memórias por 50 paus cada. Vai um aí?

  10. Ja vi uma historia bem semelhante a esta, acho que foi em um contos da cripta, sobre uma cx que havia um botão e quando a pessoa apertasse alguem morreria e ela ficaraia milionaria

    no final o cara fica milionario mas a cx vai parar nas mãos de outra pessoa, na qual a 1 pessoa não conhecia

    mas…Muito bom o texto :)

  11. muito boa essa história, consigo até imaginá-la adaptada aos atores de “o alto da compadecida” com todo aquela ironia maravilhosa. Acredito que essa história possa render bem mais, pense em incrementá-la e dará um ótimo livro. Aliás, você por acaso já tem livros com seus contos publicados? se tem gostaria de lê-los.

    Parabéns, o site é excelente!

    • Valeu, Stefania. Eu tenho um livro sim, mas ele ainda não saiu. Estou enrolando os leitores há mais de um ano com o livro,tsc,tsc. que vergonha. O outro livro que eu publiquei, um romance, foi uma tiragem muito pequena e esgotou. A boa notícia é que eu pretendo mexer no livro para mandar pro revisor hoje. Então ainda há esperança, hehe.

  12. Nossa Philipe !
    Serio Cara , essa foi uma das melhores historias que eu já li aqui no Mundo Gump.
    entro TODO SANTO DIA, já terminei TODOS os contos que tinha aqui ..
    esse seria o ultimo…
    Achei o final maneiro, então quer dizer que o nosso bem mais precioso , é aqueles que ficam por perto nas horas boas e ruins né ?
    Amo o Mundo Gump :lol2: :love:

  13. Cara muito boa a historia, não sei se alguem ja percebeu mas no iniciozinho tem um erro tipo ele faz duas viagen por dia e quando almoca tres ? não seriam quatro ?

    casa –> trabalho
    trabalho –> almoço
    almoço –> trabalho
    trabalho –> casa

    fora isso muito bom o texto acho q ja li o site inteiro

  14. Este conto causa curiosidade no leitor levando-o a meditar sobre a verdadeira felicidade. Afinal, no fechar dos olhos ao encontro inevitável, o que mais importaria  a “José Olimpio”? As terras? Caminhonetes? Televisores? Estatus que a família teria? A dignidade? A religiosidade reconhecida?Quem mais sofreria com a sua partida? O conto fala com simplicidade de algo que normalmente se reconhece por complexo, a felicidade é coisa divina e está nas coisas simples da vida…

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