A dupla hélice é uma composição geométrica consiste tipicamente de duas hélices congruentes com o mesmo eixo, que diferem por uma translação ao longo do seu eixo, que pode estar ou não a meio caminho.
Em 1953, James D. Watson e Francis Crick publicaram que a estrutura do DNA é de uma dupla hélice pela primeira vez, baseando-se no trabalho de Rosalind Franklin. A forma de dupla hélice é bastante forte. O DNA toma esta forma naturalmente por duas razões. Tem de ser ‘dupla’ de maneira que possa conseguir replicar-se e a hélice, estando entrelaçada, é mais forte que duas cadeias paralelas porque puxando em uma direção qualquer a cadeia não se desfaz.
Saindo da Biologia para a Arquitetura, não seria de todo inesperado que alguém tivesse uma ideia que incorporasse a característica de força – e por que não beleza – da Dupla Hélice do DNA em construções. E assim nasceu o conceito do Zome.
Ouvimos falar de cúpulas geodésicas, e já as vimos construídas como estufas , casas e muito mais. Exemplo? Aqui está meu post da casa esfera geodésica.
Mas você já ouviu falar de um “zome”? Uma forma de “cúpula” e um ” zonoedro polar “, um tipo de poliedro em que todas as faces são uma espécie de paralelogramo, um “zome” é uma forma harmoniosa composta por uma forma de diamante disposto em dupla espiral, terminando em um topo pontiagudo. Construídos pela primeira vez na década de 1960, os zomes de madeira, metal e até mesmo plástico, surgiram desde então em todo o mundo, dos Pirineus franceses aos Estados Unidos, e em livros como Home Work de Lloyd Kahn.
Os zomes são construídos usando apenas o losango, um quadrilátero com quatro lados de igual comprimento, mas cada linha de losangos tem seu próprio conjunto de ângulos, comprimento das diagonais e percepção da trajetória. Quando essas fileiras se juntam, a mudança gradual de graus de cada diamante produz uma sensação geral de estar sendo puxado em direção ao céu.
A essência desse movimento converge para a natureza helicoidal do zome. Universalmente presente em tudo, desde o abacaxi e a pinha até o nosso próprio DNA, a hélice está lindamente impressa em cada zome. Comece com qualquer diamante no topo e desça uma linha até um diamante com o qual ele compartilha uma borda e continue a seguir esse caminho conforme ele desce em espiral. Este processo pode ser repetido em qualquer direção de qualquer face.
Além de agregar rapidez na construção, simplificação maxima no processo, uma vez que é baseado num conceito celular, onde comum simples gabarito dá pra criar as partes todas e montar logo, os Zomes nos conectam à mesma geometria antiga que a própria vida utilizou desde o início, para maximizar sua própria eficiência e potencial.
Milhões de anos em evolução resultaram na dupla hélice. Seria burrice não perceber que é um indício maravilhoso de sua eficiência e que está na nossa cara desde sempre.
Um zome no jardim
Morando em Asheville, Carolina do Norte, Bryan Lemmel da Balanced Carpentry constrói essas formas inspiradoras de madeira recuperada. Ele é apaixonado por esta geometria.
Os experimentos de Lemmel na construção de zomes tomaram forma ao longo de um período de dois anos, depois de ver uma foto de um zome no livro de Kahn. Usando principalmente restos de madeira que seria descartada, Lemmel construiu esta ” espaçonave sônica ” para seus filhos, mas também funciona como um espaço de ioga / meditação e também como uma bangalô para os hóspedes (uma coisa digna de nota são as incríveis propriedades acústicas e ressonâncias sônicas do zome, graças à sua forma única). Dê uma olhada em algumas fotos do processo de construção e os detalhes resultantes – É muito mágico!
Um zome gigante no deserto
Um outro exemplo muito instigante do uso dos zomes ocorreu no Deserto do Novo Mexico, durante o festival Burning Man. A cada ano estruturas novas são levantadas por membros do evento. Entre carros incríveis e gente muito estranha desfilando com roupas que parecem ter saído do Mad Max, temos essas maravilhosas estruturas que são construídas e depois desmontadas no final do evento a cada ano.
No Burning Man de 2013 foi criada uma “catedral” baseada em zomes, que ficou muito legal. Eu consegui encontrar fotos das etapas de construção dessa incrível estrutura que parece ser de outro planeta. Fiquei chocado foi de perceber a velocidade estonteante com o qual a estrutura foi levantada no deserto, em poucos dias.
Ocorre que projetos desse tipo não começam no local da obra mas sim bem antes. No computador. Lá a estrutura é criada, modelada em 3d e então os elementos são usinados com um Router CNC de três eixos em placas de madeira compensada.
O router pode inclusive esculpir “vitrais” para que a luz do sol desenhe formas no interior da construção.
Então essa maquina enorme fica lá, na oficina do cara cortando painel por painel, dia e noite, por um bom tempo. Por ser uma fresa computadorizada, ela nunca cansa, nunca erra o corte, e a precisão permite encaixes de nível Jedi.
Uma vez que todos os elementos da catedral estão cortados, eles são levados de caminhão ate o local no meio de deserto e começa a montagem. Uma equipe rapidamente começa a organizar o local, que já tem a vantagem de ter o terreno nivelado, por ser o leito seco de um lago pre-histórico.
A catedral começa a ser montada de dentro para fora. As primeiras placas são montadas no chão:
Quando toda a base já esta montada, são colocados os painéis verticais, antes organizados pela sua numeração, para que não haja confusão
Então feito isso começam a levantar os painéis e montar os encaixes, com pregos e parafusos. Como é simples e rápido, essa parte rende muito e em menos de uma hora já estão sendo levantados os paineis inclinados.
Não é necessário muita gente para fazer. Mas como eles geralmente montam isso na véspera do grande evento, eles chamam os amigos para ajudar. O trabalho vara a noite do primeiro dia e na manhã seguinte a construção já esta ganhando mais corpo:
Quando é a noite do segundo dia, a construção recebe seu último painel do topo.
No dia marcado ela está pronta e a equipe posa para a foto com a “catedral” Zome:
Teve ate gente que se casou ali.
O interior da catedral é muito bonito, especialmente à noite quando os painéis luminosos (alguns deles contém leds para acender) são ligados.
Fora a catedral a equipe já levantou outras estruturas, como esta a baixo, que foi do Burning Man de 2012:
A cada ano os caras vão se aperfeiçoando e sofisticando o processo de fabricação das estruturas. Eu sinceramente acho uma pena que coisas assim tão legais sejam desmontadas.
Como os zomes são relativamente rápidos de levantar e possuem maravilhosas propriedades de resistência e acústica, eu fiquei pensando em como isso poderia ser usado para construir moldes, onde plástico de lixo reciclado poderia ser usado para criar os painéis. Posso imaginar um infinito manancial de usos para os zomes, inclusive para escolas.
Outra aplicação poderia ser a de assentamentos para desabrigados.
E não apenas como refugios passageiros, mas esse tipo de construção funciona bem para casas também, pois oferece um pé direito alto além de sua estrutura “cristalina” facetada permitir a instalação de painéis solares mais facilmente.
De volta ao uso em escolas, o sistema modular tornaria a obra barata e rápida na fase da construção. Num terreno seria possível levantar sete ou oito tendas dessas em menos de um mês, usando cada uma para uma sala, criando assim uma escola bem melhor que algumas que existem no Brasil: